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quinta-feira, 23 de março de 2017

São Simão e São Judas Tadeu, Apóstolos

De nenhum dos Apóstolos nos refere o santo Evangelho menos coisas, do que do apóstolo São Simão. É verdade que diz bastante só com assegurar-nos que Nosso Senhor Jesus Cristo o escolheu para que fosse um dos doze apóstolos, ministério, que por si só, significa mais que tudo quanto nos podiam referir os historiadores. São Mateus sempre o chama de Simão, o Cananeu; este apelido vem-lhe da cidade de Caná na província da Galiléia, onde São Simão havia nascido. São Lucas chama-o de Simão, o Zelador (Zelotes).
São Judas Tadeu era irmão de São Tiago Menor, filho de Alfeu e de Maria Cléofas.

***
Depois da Ascensão de Nosso Senhor Jesus Cristo, São Simão dirigiu-se para o Egito, onde semeando a divina semente, que com o tempo havia de converter aquela ditosa região em um terreno prodigiosamente fecundo de inumeráveis santos e como habitação de tantos milhares de anacoretas. Entretanto, não bastando ao seu ardente zelo os imensos espaços daquele país, percorreu as províncias da África, cultivando-as com tanta eficácia,  que  em pouco  tempo  foram uma  das  mais  floridas  e abundantes regiões da cristandade. Depois, impelido pelo Espírito Santo, foi levar o Evangelho à Pérsia.
São Judas Tadeu foi pregar o Evangelho na Mesopotâmia e na Líbia, onde operou inumeráveis milagres e conversões. Inspirado também pelo Espírito Santo, rumou para a Pérsia.
Qual não foi a alegria de ambos apóstolos quando perceberam que era a vontade de Deus que os dois evangelizassem juntos aquele país. Abraçaram-se e durante muito tempo conversaram sobre o Divino Mestre.
Seguiram o caminho que o Espírito de  Deus lhes havia inspirado, e, logo, encontraram um vasto acampamento militar. Como eram estrangeiros e peregrinos, deixaram-nos entrar e passar ali alguns dias.
Aquele acampamento era chefiado por Baradaque, que marchava contra os indianos, a quem o rei da Pérsia havia declarado guerra. Estava ele muito aflito, pois não sabia que inimigos iria encontrar pela frente, se a guerra seria dura e muito violenta, ou se a ganharia facilmente. Para saber a resposta, mandou chamar os magos e adivinhos para que consultassem os deuses. Dentre estes encontravam-se dois magos que eram temidos e respeitados por todos, Zaroés e Arfaxat, os mesmos que haviam sidos expulsos da Etiópia por São Mateus. Por meio de ritos e fórmulas de bruxaria tentavam eles fazer com que os ídolos lhes revelasse o futuro que só a Deus pertence. Debalde todos os esforços, nada conseguiram. Este repentino silêncio causou estranheza e temor em todo o exército.
Zaroés mandou então que um mago fosse consultar um outro ídolo que distava algumas léguas do acampamento. O demônio ali respondeu por meio do ídolo, dizendo:
– A presença dos dois estrangeiros no acampamento de Baradaque fechou a boca de todos os deuses do império! O poder desses dois homens são tão formidáveis, que nenhum de nós se atreve a aparecer ou manifestar-se diante deles!
Esta notícia chegou célere ao acampamento e logo inflamou os ânimos dos magos e adivinhos do exército que acorreram tumultuosamente à tenda do general Baradaque, pedindo, em altos gritos, a morte imediata dos dois estrangeiros!
Baradaque, que era homem cauto e não queria andar com precipitação, mandou que chamassem os dois estrangeiros. Quando estes compareceram em sua presença, Baradaque lhes perguntou:
– De onde vêm? Quem sois? E o que querem fazer aqui?
São Simão, adiantando-se um passo, disse ao general:
– Se quereis saber nossa nacionalidade, somos hebreus. Se quereis saber nossa condição, somos enviados de Jesus Cristo! Se quereis saber o motivo de nossa vinda, é para salvá-los!
Esta resposta impressionou vivamente a Baradaque e aos oficiais.
– Quando eu tiver voltado da guerra quererei escutá-los com mais calma. – disse Baradaque.
São Judas lhe respondeu:
– Seria melhor conhecer agora Aquele que pode fazê-lo vencer!
– Vejo que são mais poderosos que nossos deuses! Por favor, queiram aceitar de entrar em minha tenda. Quero ouvi-los!
No interior da tenda os santos apóstolos explicaram a santidade e a verdade da religião de Nosso Senhor Jesus Cristo. Fizeram-lhe sentir as imposturas e embustes de todos aqueles encantadores, e igualmente a fraqueza e a imbecilidade de todos os ídolos; e para acabarem de o convencer, acrescentaram que convidasse aqueles adivinhos a pronunciarem-se sobre o resultado da guerra.
Enquanto essa conversa transcorria, dois homens agitavam-se ferozmente, Zaroés e Arfaxat. Tinham ouvido claramente o nome que os apóstolos pronunciaram e para logo perceberam que teriam de enfrentar-se novamente, não apenas com um, mas dois discípulos do Senhor. Suas diabólicas mentes já estavam preparando ciladas para São Simão e São Judas, quando um oficial os chamou para dentro da tenda de Baradaque.
– Aqui estão os maiores magos da Pérsia - disse Baradaque, assim que viu Zaroés e Arfaxat entrarem.
– Pois então, dizei que consulte os deuses a respeito de como será a guerra - disse São Simão.
Saíram os dois magos sem dizer palavra e logo voltaram contentes, trazendo a resposta dos deuses:
– Enviados dos deuses, e deuses nós mesmos, dizemos que a guerra será longa, perigosa e sangrenta!
Apesar  das  palavras  que  ouvira  anteriormente  dos  apóstolos,  Baradaque empalideceu diante da sentença lançada pelos magos.
Os dois apóstolos não puderam conter um riso, e logo em seguida, disse São Judas ao general:
– Não tenhais medo, porque a paz entrou aqui conosco! E São Simão completou:
– Agora conhecereis, senhor, a falsidade e a impostura de vossos oráculos. É tão falso o que dizem esses homens, que amanhã a esta hora, chegarão ao acampamento, embaixadores dos indianos e vos pedirão a paz com as condições que quiserdes impor-lhes, sem a mínima resistência!
Ao ouvirem as palavras dos apóstolos, Zaroés e Arfaxat puseram-se a rir diabolicamente, e disseram ao general:
– Estes aí querem inspirar segurança para que, não tomando cuidado, vós sejais derrotado pelo inimigo!
– Não dissemos “esperai um mês”, mas um dia! Amanhã vereis os embaixadores da Índia entrando no acampamento e pedindo a paz! - responderam os apóstolos.
Então,  Baradaque  mandou  vigiar  os  dois  apóstolos,  a  fim  de  lhes  prestar homenagem se tivessem dito a verdade, ou puni-los por sua mentira criminosa.
Todo o exército esteve em impaciente expectação até ver o efeito da profecia. De fato, no dia seguinte, chegaram os embaixadores à hora aprazada, e concluiu-se a paz, como se quis!
À vista  de  tão  maravilhoso  sucesso,  o  general  e  alguns  de  seus  oficiais acreditaram nos apóstolos e queriam mandar que fossem queimados Zaroés, Arfaxat e os outros magos. Mas foram impedidos pelos dois santos, que tinham sido enviados não para matar os vivos, mas para ressuscitar os mortos!
Cheio de admiração por eles não terem deixado matar os sacerdotes dos ídolos e não terem aceitado receber riquezas, Baradaque levou-os até o rei da Pérsia e contou diante de toda a corte tudo o que se passara no acampamento do exército.
Então, os apóstolos tomando a palavra anunciaram a salvação ao rei, à sua família e a toda a corte. Todos se maravilharam e pediram que os dois santos os instruíssem naquela santa religião, pois queriam receber o batismo!
Tendo os apóstolos saído do palácio real, apresentaram-se Zaroés e Arfaxat diante do rei, e disseram:
– Esses homens são perigosos! Eles tramam contra o reino!
Baradaque, que estava ao lado do rei, lhes disse: – Se ousam, lutem contra eles!
Os magos disseram:
– Se quiserem, vejam como os homens mais eloquentes não poderão falar em nossa presença, e se puderem abrir a boca diante de nós que fique provado a nossa impotência.
Levaram à presença dos magos, embaixadores, advogados e filósofos, que no mesmo instante tornaram-se mudos. Os magos disseram ao rei:
– A fim de que saibais que somos deuses, vamos permitir que eles falem, mas que percam os movimentos!
E assim foi feito, e todos ficaram impressionados e temerosos diante dos magos. Baradaque saiu do salão e foi chamar os dois apóstolos que estavam num dos aposentos do palácio. Ouviram o relato do general e logo perceberam a maldade dos magos e a ação dos demônios. Dirigiram-se ao salão onde se encontravam os magos e, ao entrarem, ordenaram em nome de Jesus que aqueles pobres homens voltassem a ter os movimentos livres, o que imediatamente se verificou.
Os magos, ao tentarem novas artimanhas, viram que não tinham mais poder sobre homem algum. Irritados ao se verem vencidos diante de todos, os magos abriram um grande cesto de vime e dele saíram perigosas serpentes.
Os apóstolos fazendo no ar o Sinal da Cruz fizeram com que todas as serpentes ficassem paralisadas e juntando uma a uma encheram seus mantos com elas e jogaram-nas sobre os magos, dizendo:
– Em nome do Senhor Jesus, vós não morrereis, mas apenas suas carnes serão mordidas pelas serpentes e darão gritos de dor!
Como as serpentes mordiam suas carnes e eles uivavam como lobos, o rei e os demais presentes rogaram aos apóstolos que fizessem com que elas matassem aos magos. Mas os apóstolos responderam:
– Fomos enviados para reconduzir da morte à vida, não para precipitar da vida na morte!
Depois de terem feito uma prece, ordenaram às serpentes que parassem de dilacerar as carnes dos magos e retornassem ao cesto. Os apóstolos disseram aos magos que gemiam de dor:
– Durante três dias sentireis dor, mas no terceiro estarão curados para que renunciem à maldade.
Transcorridos os três dias sem que os magos pudessem comer, beber ou dormir, tão grandes eram seus sofrimentos, os apóstolos foram ao encontro deles e disseram:
– O Senhor não aceita que o sirvam à força. Levantem-se, estejam curados!
Convertam-se, ou partam para onde quiserem.
Porém, Zaroés e Arfaxat persistiram na maldade, afastaram-se dos apóstolos e partiram para uma cidade que ficava longe do palácio real.
Surpreendentes milagres
Muitos outros milagres confirmaram a verdade das palavras dos apóstolos, e em pouco tempo grande era o número dos fiéis. Após um ano de pregação, mais dois fatos milagrosos iriam converter as multidões para Nosso Senhor Jesus Cristo.
A filha de um comandante dera à luz uma criança e acusara um diácono de ser o seu pai. Os pais da moça queriam matar o diácono, mas os apóstolos foram até eles e perguntaram:
– Quando se deu o nascimento da criança? – Hoje mesmo, à primeira hora do dia!
São Simão ordenou:
– Tragam a criança e façam vir o diácono acusado!
Quando isso foi feito, São Judas olhando para a criança perguntou:
– Diga-nos, criança, em nome de Jesus Cristo Senhor Nosso, se esse diácono fez o que lhe acusam?
Para espanto e admiração de todos o recém-nascido respondeu: – Esse diácono é casto e santo! Jamais maculou a sua carne!
Como os pais da jovem insistiam que os apóstolos perguntassem quem fora o autor do crime, eles responderam:
– Nosso dever é libertar os inocentes, não arruinar os culpados!
Três dias depois, dois tigres escaparam de suas jaulas e feriam e devoraram todos os que encontravam. Os apóstolos foram até eles e em nome de Nosso Senhor tornaram-nos dóceis como cordeiros.
Como os apóstolos tencionavam partir, pois queriam continuar a pregar o Evangelho em outras partes, o rei e todo o povo pediram que ficassem mais um pouco. Eles aquiesceram ao pedido, e ficaram 1 ano e 3 meses, tempo no qual mais de 60 mil homens, sem contar seus filhos pequenos, foram batizados.
Castigo dos magos, glória dos Apóstolos
Depois de derrotados e humilhados pelos santos apóstolos, os magos Zaroés e Arfaxat retiraram-se para a cidade de Samir. Ali, aqueles malvados levantaram o ódio  do  povo  e  de  seus  setenta  sacerdotes,  contra  o  santo  nome  de  Jesus. Congregaram a todos e disseram que homens maus, vindos de longe, queriam destruir os deuses e escravizar o povo. Um brado de indignação levantou-se em toda a cidade, e eles juraram matar quem ousasse ofender aos deuses.
Passado o tempo que deviam ficar na capital do reino da Pérsia, os apóstolos sentiram uma inspiração divina de irem para outras regiões. Muitas foram as cidades que percorreram e grande o número de conversões. Finalmente, chegaram à cidade de Samir.
São Simão, voltou-se para São Judas e disse-lhe com muita bondade:
– Cumpre agora que bebamos o mesmo cálice de Nosso Senhor!
– Conservemo-nos no amor de Deus, e esperemos a misericórdia de Nosso Senhor Jesus Cristo e assim alcancemos a vida eterna! - disse São Judas.
Assim que cruzaram as portas da cidade, Arfaxat gritou:
– São eles! Prendam-nos! Prendam-nos! Levem-nos ao templo e se recusarem o incenso aos deuses, deverão morrer!
Imediatamente os apóstolos foram presos pelos sacerdotes e por alguns do povo e conduzidos violentamente ao Templo do deus sol e da deusa lua.
Quando o magote do povo e dos sacerdotes, conduzidos por Zaroés e Arfaxat entraram no templo com  os  apóstolos,  os  demônios  puseram-se  a  gritar  por intermédio de vários homens que caíram possessos:
– Ai!!!! O que há entre nós e vós, apóstolos do Deus vivo? Que viestes fazer aqui?! Desde que aqui chegaram nosso tormento aumentou!!!
Neste momento, em que todos ficaram aterrados, um Anjo do Senhor apareceu no templo, mas era apenas visto pelo apóstolos. Disse-lhes o Anjo:
– Deus vos dá a escolher: Ou que esta gente seja castigada e vós libertados, ou aconteça agora, o vosso martírio.
São Judas, levantando a voz disse ao Anjo, ao mesmo tempo que era ouvido por todos:
– É preciso adorar a misericórdia de Deus para que ela converta todos os habitantes desta cidade e nos conduza à palma do martírio.
E São Simão, voltando-se para o povo que acorreu em grande número para o templo, disse:
– Somos enviados de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho do Deus Altíssimo! Viemos aqui para a vossa salvação! E para convencê-los de que os ídolos que erroneamente adorais são falsos e estão ocupados pelos demônios, ordenamos que saiam e quebrem cada um a sua estátua!
Imediatamente, duas figuras escuras saíram das estátuas e depois de as terem quebrado retiraram-se soltando gritos horríveis. Vendo isso, Zaroés e Arfaxat gritaram aos sacerdotes:
– Matem-nos!
Os sacerdotes lançaram-se sobre os apóstolos, cobrindo-os de socos e pontapés e, em seguida, arrastaram-nos para fora. São Simão foi serrado ao meio, enquanto que a São Judas cortaram a cabeça com um machado.
Julgando-se vitoriosos contra o Deus que nunca é derrotado, Zaroés e Arfaxat ordenaram que os sacerdotes entrassem no templo para adorar os deuses. Nesse instante, embora o céu estivesse sereno, apareceram negras nuvens e relâmpagos tão violentos que, caindo sobre o templo começaram a despedaçá-lo. Apavorados, os dois magos saíram correndo do templo, mas foram atingidos por dois raios e ficaram reduzidos a carvão. Todo o templo ficou destruído e os sacerdotes sepultados nele.
O povo, cheio de temor, enviou emissários ao rei da Pérsia a fim de relatarem todo o ocorrido. Este foi em pessoa buscar os corpos dos santos apóstolos e levou consigo outros padres e diáconos para anunciarem a fé àqueles pobres homens.
O rei transportou os corpos dos apóstolos para sua cidade e mandou erguer em honra deles uma Igreja de admirável magnificência.
A Igreja comemora a festa de São Judas e São Simão no dia 28 de outubro.
Fonte: Jacopo de Varazze. Legenda Áurea. Companhia das Letras







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